Apontamentos do espanto na crise da covid-19

 

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Discutir jornalismo nunca é demais. O jornalismo é um dos pilares da democracia, a instituição que aponta, critica, debate os problemas e os desafios de uma sociedade. Se é essencial no dia a dia, em tempos normais, torna-se dramaticamente imprescindível em épocas de crise. Como a atual, em que uma pandemia capotou o modus vivendi global.
A jornalista Cremilda Medina, professora titular da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP, debruçou-se com seu grupo de pesquisa, Epistemologia do Diálogo Social, “sobre os relatos, narrativas e comentários que vêm se sucedendo nas mídias” em relação à covid-19. O texto a seguir é uma importante contribuição acadêmica para o debate sobre o papel do jornalismo na superação deste angustiante e desafiante momento enfrentado por todos nós.
Luiz Roberto Serrano

Primeiro momento: o despertar dos espantos

Cremilda Medina, março/abril de 2020

Dedico estes apontamentos ao jornalista Marcello Bittencourt, amigo e profissional histórico da Rádio USP, que nos deixou em abril de 2020, vítima do novo coronavírus.

Durante o período da quarentena provocada pelo novo coronavírus, a produção de pesquisa do grupo que coordeno – Epistemologia do Diálogo Social – não ficou em isolamento. Pelos meios digitais disponíveis, fizemos reuniões e escrevemos reflexões resultantes do acompanhamento dos relatos, narrativas e comentários que vêm se sucedendo nas mídias. O caderno de apontamentos epistemológicos que se segue está composto de três momentos: primeiro, observações que alinhei de março a abril de 2020; segundo, acréscimos de maio, escritos por dois orientandos de doutorado na USP, Gean Gonçalves e Carolina Klautau; terceiro, uma leitura cultural que fiz sobre os depoimentos de 129 jornalistas, publicados no portal Jornalistas & Companhia, no início de junho.

Trata-se de um caderno de apontamentos aberto, de indicação de tendências em processo no vale das incertezas e do provisório.

Volatilidade, incerteza, complexidade, ambiguidade – quatro variáveis epistemológicas que Paulo Roberto da Silva Gomes Filho (coronel de Cavalaria do Exército) captou de bibliografia internacional para analisar o atual momento em artigo publicado no jornal O Estado de S. Paulo, na edição de 25 de março de 2020. Li com total sintonia o conteúdo de cada uma dessas quatro noções que o autor vincula à interpretação da atual pandemia e aos desafios decisórios das sociedades em estresse perante a expansão implacável da doença coletiva.

Para o autor, a volatilidade se manifesta na extrema velocidade dos acontecimentos; a incerteza, desencadeada pela volatilidade, provoca uma pluralidade contraditória e complexa de decisões; o que, aumentando o grau de incertezas na complexidade, leva à ambiguidade de perspectivas, discordâncias e discrepâncias culturais. Esse um caldo maldito na produção de sentidos que regem os discursos e as ações práticas no enfrentamento da adversidade planetária.

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Imagem: Pixabay

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